Com o surgimento da ferrugem do cafeeiro, no Brasil, em 1970, alterou-se o comportamento tecnológico na cafeicultura. As pulverizações, que só ocorriam eventualmente passaram a ser espaçadas de 30 em 30 dias, iniciando em novembro e indicava-se de 4 a 5 aplicações com Oxicloreto de cobre 50% na dose média de 4 – 5 kg/ha e, ainda fazíamos o controle de pragas em média 2 a 3 aplicações totalizando de 6 a 8 aplicações o que dificultou em demasia os tratos culturais. No final de 1976 iniciaram se as primeiras vendas do produto sistêmico (?), denominado Sicarol, da firma Hoechst, que não emplacou no mercado pela baixa eficiência no controle da ferrugem (Hemileia vastatrix). No final de 1976 a Bayer iniciou os trabalhos com o Triadimenol (fungicida sistêmico do grupo dos triazóis), a qual foi pioneira no descobrimento dessa importante molécula. Lembro-me que nessa época contatamos os técnicos do extinto I.B.C que eram comandados pelo Dr. José Bráz Matiello que repassou os ensaios para o Dr. Zito Mansk do Espírito Santo e Dr. Saulo Roque de Almeida de Varginha / MG, entre outros pesquisadores. Com isso iniciou – se uma nova etapa para a cafeicultura. O Triadimenol com duas aplicações controlava a ferrugem eficientemente.
O Triadimenol, com o nome comercial de Bayleton, era vendido para trigo com excelentes resultados nas doenças indicadas. O trigo era uma cultura com grande esperança nacional. Os inícios dos trabalhos da Embrapa foram calcados na triticultura principalmente no sul do Brasil. A Bayer dominava esse mercado e ao mesmo tempo trabalhava paralelamente o café com Bayleton mas , sem grandes focos na cafeicultura pois a logística comercial concentrava se em soja e trigo numa indicação de “dobradinha” na rotação de culturas, muito preconizada tanto pela Embrapa como os agrônomos de modo geral. Infelizmente o trigo não deslanchou a contento, apesar da alta tecnologia introduzida pela Embrapa, tanto para as variedades nacionais, mais ao sul do Brasil, e as mexicanas no norte e oeste do Paraná e Mato Grosso do Sul e São Paulo. Por outro lado, a soja que tinha uma área incipiente, passava a crescer rapidamente e chegamos como a principal cultura no Brasil inclusive, responsável pela abertura do centro oeste brasileiro. Um tremendo sucesso e hoje, sabemos como a soja introduzida pelos Paranaenses e, principalmente os Gaúchos, que sem dúvida alguma, foram os principais responsáveis da abertura do Centro – Oeste e, a região em apenas 20 anos tornou se um forte seleiro do Brasil e do mundo. Temos que “tirar o chapéu” para os gaúchos. No café iniciou-se com os paulistas, paranaenses e depois os mineiros, pela ordem de crescimento de produção. Hoje, Minas Gerais domina a cafeicultura.
Com as aplicações sucessivas de Triadimenol e o café permeando as lavouras de trigo, principalmente no norte do Paraná e, muitas fazendas tinham trigo e café, os abastecimentos dos pulverizadores numa caixa de água centralizada na fazenda e muitas das quais rodeadas de café passaram a observar que aqueles cafeeiros próximos ao abastecimento permaneciam enfolhados e sem ferrugem. Isso despertou “os olhos” do vendedor Sr. Valentim e do agrônomo do I.B.C de Paranavaí, Dr. Ronaldo de Campos Borges, que atualmente, é um profissional respeitado e também cafeicultor em Araxá , Minas Gerais. Em 1984 começamos a visitar algumas experiências de campo juntamente com o Eng. Agrônomo Juan Cândia Navarro, chileno e agora brasileiro de coração, residente em Varginha- MG e trabalha na Basf. O Juan estava surpreendido pelos resultados demonstrativos na fazenda de café, da família Formigoni, em Paranavaí. Aplicava-se o Bayleton misturado com o Disyston (Dissulfoton) granulado que já era um produto referencial para controle de bicho-mineiro (Perileucoptera Coofeela) e cigarras do cafeeiro principalmente do gênero Quesada. Em 1984, visitamos as áreas e também fiquei impressionado com os resultados e comprei a idéia e junto o Dr. Da Ross gerente técnico da Bayer, hoje, executivo do Sindag em São Paulo, que nos deu total autonomia para encaminharmos a tecnologia. Passamos a trabalhar intensamente o café. Levamos o diretor técnico, Dr. Eckstein, um experiente técnico alemão e, iniciamos o desenvolvimento. Lembro-me que o Dr. Eckstein disse-me: “ficará caríssimo precisará de duas bases assim: Primeiro: – Estudar a relação custo benefício e; Segundo: – A dose tem que ser em I.A (ingrediente ativo)/ha pois, como iríamos dosar se tínhamos cafeeiros espaçados 4 por quatro, quatro plantas por cova. Por volta de 620 covas/ha e chegando a 5.000 plantas/ha plantados em Minas no sistema renque e, já se iniciava os adensados com até 10.000 plantas/ha
Com inúmeras variáveis de 620 a 10.000 plantas/ha realmente a única saída para a dosagem seria dosar em I.A (ingrediente ativo) por hectare do que por planta. Estávamos num estágio mais adiantado comercializando a mistura preconizada de
Bayleton mais Disyston, principalmente no Paraná, no espaçamento 4 por 4, com uma dose única por cova, como prevalecia no Paraná. Nessa época ainda existiam 500.000 a 600.000 has de café no Paraná e as respostas dos resultados do produto eram espetaculares aumentando a produtividade a níveis como 50% em relação ao convencional pulverizado, principalmente com Oxicloreto de cobre. A grande dúvida era o custo por hectare pois, argumentavam inclusive alguns da Bayer, que o produto não poderia ultrapassar o preço de um hectare de terra. Realmente pensando por esse lado era um absurdo mas, o aumento da produtividade deixava uma relação custo x benefício extremamente favorável e os resultados já corriam fronteiras e o mercado demandando o produto. Como iríamos para Minas Gerais com dose por planta/cova? Onde se dava uma confusão enorme. Ninguém pensava no café em dose por hectare e sempre utilizaram dose por cova ou por planta.
As pesquisas andavam a todo vapor numa embalada frenética e a Bayer dando total autonomia e o produto sendo testado em dose de I.A (ingrediente ativo) / hectare, na pesquisa interna, na pesquisa oficial principalmente pela equipe do Dr. Matiello do extinto I.B.C. O primeiro relatório técnico nesse sentido foi emitido pelo agrônomo da Bayer, no norte do Paraná, Ademir Santini, hoje, ainda na Bayer em Curitiba. O Santini nos relatou que a dose por hectare teria que ser entre 400 a 500 gramas de ativo /ha do Triadimenol. Isso abriu um leque enorme e partimos dessa base até chegarmos a uma dose que era heterogênea por hectare baseado no número de plantas por hectare. A posterior determinamos que além de ser dose/há, teríamos que adequar de acordo com a produtividade. Nessas alturas muitos agrônomos não correlacionavam produtividade com o potencial da doença. A Bayer registrou o Baysiston, uma formulação pronta (Triadimenol mais Disulfoton). O Triadimenol já uma fase mais adiantada do triazol triadimefon e, com melhor eficiência técnica.
No andamento das vendas e investimento forte em pesquisa, como exemplo, o próprio signatário possui 108 trabalhos de pesquisa com Triazóis / Baysiston, publicados em Congressos de Café, visando os seguintes lados técnicos como: aumento da produtividade, aumento do sistema radicular (ação hormonal), aumento de café cereja, maior resistência a seca, melhor vigor vegetativo, MIP, análises de resíduos em todos os países consumidores de café, sistema de aplicação, entre outros. Considerado o produto mais pesquisado no Brasil, detectamos a necessidade de aumentar a adubação pois, o cafeeiro não resistia à carga. Na época o Dr. Santinato, do extinto I.B.C, pesquisou e disse-nos que teríamos que quase dobrar a dose, principalmente de nitrogênio e potássio e, também dosar o adubo por hectare e não mais por cova ou planta. Revolucionamos a adubação após inúmeras pesquisas e, todos técnicos vendo os resultados de pesquisa nos Congressos de Café e, na prática, aderiram rapidamente. Nessas alturas o Baysiston deslanchou juntamente com a produtividade. Quebramos diversos paradigmas seculares e saímos de uma produtividade histórica de 150 anos de mensuração com 09 sacas por hectare (vide livro Cafeicultura Brasileira de Marcelino Martins) e, hoje, estamos batendo nas vinte sacas em média. Logicamente houve uma interação de tecnologias além, do controle fitossanitário e da adubação. Mas, a praticidade de aplicação única no solo contra a ferrugem e pragas, sem transportar altos volumes de calda, num só produto, Fungicida + Inseticida que até então, o único produto no mercado, diminuindo a compactação e maior praticidade contra, em média 6 aplicações do convencional. Uniu-se a praticidade com maior produtividade.
A equipe da Bayer e principalmente os agrônomos do I.B.C, tiveram uma enorme capacidade para essa revolução tecnológica e totalmente brasileira, pois, o Baysiston só existia no Brasil portanto, um produto brasileiro e revolucionário, pois, com a visão de aplicação via solo abriu se o leque para outras sistemáticas como o Imidacloprid em aplicação drench no tabaco que também foi revolucionária contra o sistema de 4 aplicações de inseticidas em pulverização. Um ponto importantíssimo é que a equipe era e são apaixonados pela cafeicultura e quase todos como cafeicultores agarraram o lado técnico com o lado vivencial.
Revolucionou a cafeicultura e abriu-se o horizonte para novos desenvolvimentos de pesquisa de fungicidas e inseticidas, dobramos a produtividade graças ao empenho técnico de outros grandes agrônomos como Rodolfo San Juan hoje, na Bayer em Franca, Eng. Agrônomo José Alberto Paranaíba, ainda trabalhando na Bayer, e o Eng. Agrônomo José Lourenço atuando em Minas e residindo em Belo Horizonte. Muitos colegas tiveram méritos nessa revolução tecnológica mas, esses citados foram os “cabeças” nessa empreitada. Inclusive o lema na cafeicultura era “Uma cafeicultura antes e outra depois do Baysiston”.
Ainda a Bayer introduziu nos anos 90, o sistema de troca física de café por insumos, com total segurança aos cafeicultores pois, a Bayer trabalhava com corretora e os preços de garantia travados na BM&F. O produtor só levava vantagens. Dentro desse trabalho, o engenheiro André Luis Brante, atualmente diretor da Bayer em Ribeirão Preto, teve papel importantíssimo pois, foi um “Baluarte” na introdução dessa modalidade de negócio.
Esses técnicos citados foram empáticos e comprometidos com o trabalho e com nossa cafeicultura. No último Congresso Brasileiro de Café, em novembro de 2011 , os encontrei em Poços de Caldas, ficando muito feliz em revê – los dentro de um espírito de amizade marcando minha vida profissional. Rendo uma homenagem especial a esses verdadeiros amigos de muitos anos de trabalho pois, esse signatário oriundo do bairro do Rio Claro lá de São João da Boa Vista – SP, sai da roça, fui descalço para a escola primária como um caipira e, tornei-me um executivo de uma grande multinacional. Andei pelo mundo, não só cafeeiro, graças ao empenho e apoio desses colegas e amigos.
A partir desse trabalho implantado surgiram novas firmas que vieram depois ajudando a solidificar a sistemática de controle da ferrugem e hoje existem diversas opções e grande parte dos cafeicultores aderiram ao método de controle via solo. Hoje, é uma realidade o excelente controle de ferrugem juntos com algumas pragas que provocam seguramente 50% de prejuízo na produtividade.
Escrever do feito é fácil, o difícil é continuar evoluindo mas, nenhuma edificação consegue se manter se não tiver um bom alicerce. Outro aspecto que ouvi na última formatura de agrônomos da ESALQ em Piracicaba: “- O Agrônomo além de Hi Tech precisa do seguinte: plantando amizade, cultivando relacionamento e colhendo resultado” dito pelo Eng. Agrônomo professor Drº Marco Jank, paraninfo da turma de agrônomos da ESALQ. Três verbos na frase dita: plantar, cultivar e colher. Todos estão conjugados no gerúndio. O passado está pronto vamos continuar construindo em prol dessa estupenda e maravilhosa Agricultura Brasileira.
Armando Matielli
Engenheiro Agrônomo
MBA na FGV
Cafeicultor em Guapé / MG
Presidente Executivo da SINCAL