A notícia sobre o questionamento em relação aos benefícios dos produtos orgânicos foi uma das mais comentadas e debatidas no BeefPoint. Alguns podem se perguntar se os recentes problemas e críticas estão enfraquecendo o mercado dos produtos orgânicos. O mercado mundial de produtos com certificação orgânica, “natural”, boas práticas agropecuárias (como o Eurepgap) continuam crescendo, e muito. Nos EUA, o mercado de carne com certificação “natural” cresce ano a ano.
O fato é que o consumidor está cada vez mais informado e preocupado em adquirir alimentos saudáveis, produzidos de forma sustentável. Sustentabilidade econômica, social e ambiental. Notícia do jornal O Estado de S. Paulo de hoje informa que a Natura, empresa mais admirada do Brasil e patrocinadora do São Paulo Fashion Week, vai lançar mais produtos focados em sustentabilidade durante o evento.
Talvez a produção orgânica não seja a melhor opção para produção de alimentos em larga escala, alimentando grande percentual da população mundial, mas é inequívoco que a produção “tradicional” deverá adotar práticas, que no passado eram adotadas apenas por produtores orgânicos. É inequívoco também que haverá uma maior necessidade de garantias e fiscalização, por parte dos produtos orgânicos, naturais e também dos “convencionais”. Nesse ponto, a produção certificada está a frente dos produtos convencionais.
A transparência vai aumentar em todas as relações comerciais. O acesso a inúmeras formas de informação e comunicação, como internet, celulares com câmeras fotográficas, só para exemplificar, aumenta o poder do consumidor e diminui a facilidade de se esconder a “sujeira debaixo do tapete”. O impacto de tudo isso ainda é pouco conhecido.
A revista National Geographic, que é vendida em inúmeros países (circulação de 5 milhões de exemplares só nos EUA) e detentora de grande credibilidade, publicou recentemente uma reportagem de capa sobre o desmatamento na Amazônia, mostrando fotos de satélites, entrevista com o governador do MT, Blairo Maggi e fotos da pecuária de corte na região. A reportagem, como outras, aponta a pecuária de corte como uma das causas do desmatamento da Amazônia.
Qual será a melhor forma de enfrentar esse desafio? Tentar evitar que fotos e reportagens “vazem” parece ser cada vez mais difícil (ou impossível). A cadeia da carne, quando age, tem respondido verbalmente às acusações, mas ainda não há um plano conjunto para efetivamente encarar esse problema. Haverá outro caminho, mais pró-ativo, para tornar o sistema de produção brasileiro menos vulnerável a críticas internacionais?
A entidade que representa os produtores de café de qualidade, conhecida pela sigla BSCA, já desenvolveu um programa de certificação de boas práticas na produção de café, visando garantir, assegurar e divulgar com muito mais impacto que o café “gourmet” brasileiro é produzido de forma sustentável. Todos os produtores filiados a essa associação adotam essa certificação, que segundo especialistas em café, é bem aceita no mercado. No leite, a DPA também está com um programa de certificação de boas práticas agropecuárias.
Seria muito interessante se entidades brasileiras, de produtores ou de exportadores, desenvolvessem programas de certificação, que poderiam ter como benchmarking o selo Eurepgap, e estimulassem a adoção desses programas em larga escala no Brasil. Em alguns dos países que mais protestam contra a carne bovina brasileira na Europa, o percentual dentre o total de fazendas de gado de corte que já adotam boas práticas agrícolas ultrapassa os 80%. O Chile criou um programa de boas práticas agrícolas, para produção de frutas, em conformidade com o Eurepgap chamado Chilegap. De um lado atestam a qualidade para os compradores internacionais, do outro promovem os diferenciais do produto chileno para o consumidor final, coisa que o Eurepgap não permite.
“Todos os caminhos… hoje, levam à UE. Ao mesmo tempo em que é grande o potencial do produto nacional de entrar em um mercado importante, barreiras econômicas, ambientais e logísticas poderão impedir… Especialistas afirmam que, ao ir com muita sede ao pote…, os produtores brasileiros e o governo poderão ver muitas oportunidades serem perdidas, por falta de um plano estratégico”. Essa afirmação, publicada no jornal Folha de S. Paulo, do último domingo se refere ao mercado de biodiesel e outros bio-combustíveis. No entanto poderia ser utilizada para a cadeia da carne bovina brasileira. Assim como no biodiesel, o mercado para carne bovina é muito grande, mas pode ficar muito prejudicado se o setor não se preparar para os desafios, de forma organizada.
O Brasil vem sofrendo cada vez mais ataques em relação ao meio-ambiente, em especial contra a carne bovina. Devido a pressões de grupos ambientalistas, a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) decidiram não comercializar a safra de soja oriunda de áreas que forem desflorestadas dentro do Bioma Amazônico. Os exportadores de biodiesel e álcool também já se deparam e se preparam para barreiras ao produto brasileiro.
Nos últimos dias, o BeefPoint publicou alguns artigos, que podem ser analisados em conjunto, inclusive com a leitura das cartas:
– UE tem novas regras de bem-estar animal no transporte
– Bertin vai investir em projeto ambiental no Pará
– Com Eurepgap, Bertin espera ampliar exportações
A pergunta é: como a cadeia da carne, em especial o produtor, pode se beneficiar dessas mudanças (ou, ao menos, não se prejudicar)? Gostaria de saber sua opinião, pela seção de cartas do leitor, abaixo.
Há alguns dias li um provérbio sueco, que talvez possa explicar, pelo menos em parte, a situação da pecuária de corte atual. “There is no bad weather, just bad clothing”, em tradução livre, algo como “Não é o tempo que é ruim, mas sim as roupas que você usa”.