Os Embargos de Declaração no Cade

Publicação: 05/06/07

5 de junho de 2007 | Sem comentários Comércio Exportação
Por: GAZETA MERCANTIL

Omissão, obscuridade e contradição: esses são os pressupostos materiais, via de regra, para que se oponha recurso de Embargos de Declaração (ED) de uma decisão nos termos do Código de Processo Civil, artigo 535, e também nos termos da Resolução Cade n.26/02 e do artigo 83, da Lei 8.884/94. Em conjunto com os pressupostos materiais, o julgador deve aferir a legitimação e a inexistência de fato impeditivo ou extintivo da faculdade de recorrer a fim de reconhecer como cabível o recurso e, logo, adentrar seu mérito para dar-lhe ou não provimento.


Havendo assim previsão legal, interesse e ausentes fatos impeditivos, entende-se que os embargos possuem pressupostos de admissibilidade e o embargante legitimidade recursal, logo, direito de ver seus embargos conhecidos e avaliados quanto ao mérito. Nesse sentido, tem se posicionado o Cade, adotando a melhor lição da doutrina e da jurisprudência dominante, sobretudo do Superior Tribunal de Justiça (STJ).


No tocante ao interesse, o Cade tem admitido, ao longo de sua história, uma participação, embora restrita, de interessados (não-partes), contanto que estes demonstrem a conexão das relações jurídicas diretamente relacionadas à decisão embargada com direitos seus. Assim restou consignado na Resolução 26/02, como também na jurisprudência predominante (são várias as decisões que serviriam de exemplo, sendo a mais recente a admissão dos Embargos de Declaração opostos pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil – CECAFÉ – contra eventual omissão do Cade, julgada em março).


Importa salientar que reiterada coerência do posicionamento do Conselho nesse particular fortalece o primado da segurança jurídica tão caro à sociedade, considerando seu valor positivo e motor ao desenvolvimento social e econômico nacional, sem adentrar na questão controversa do cabimento da participação de terceiros interessados nos processos do Cade, debate ainda intenso em face da relevância do tema (de uma lado defende-se restringi-la tendo em vista a recorrência do uso dos processos como meios de chantagens, balcão de negócios, enfim, de se consignar finalidades espúrias, e de outro a maior abertura do órgão à mais ampla gama de versões dos fatos em busca da verdade material).


No tocante ao mérito, o Cade tem entendido que os ED podem, em caráter excepcional, também possuir efeitos infringentes se, e somente se, referido efeito for conseqüência necessária do provimento dos mesmos. Ainda nesse particular (mérito), muitos são os precedentes de ED conhecidos pelo plenário, opostos por terceiros e/ou por partes, visando corrigir eventuais contradições entre acórdãos e votos vencedores.


De forma diversa de seu reiterado posicionamento, o Cade não conheceu, recentemente, os ED opostos pela Montecitrus Trading, justificando para tanto que a embargante não possuía interesse, uma vez que não era parte no processo cuja decisão fora embargada (por eventual contradição do acórdão com os votos dos Conselheiros). Nesse caso, a Montecitrus foi a representante no processo administrativo que originou o acórdão embargado, instaurado em razão de rescisão unilateral de contrato pela Cargill Agrícola com a Montecitrus Trading, o que poderia ter prejudicado direitos e interesses privados desta última e ao mesmo tempo poderia significar uma infração à ordem econômica.


A relação jurídica decidida no acórdão embargado envolvia diretamente os interesses da embargante. Como se vê, afora a procedência ou não das alegações de mérito da Montecitrus, a decisão de não conhecimento dos ED por ausência de interesse da embargante vai de encontro à jurisprudência consolidada do Cade. Ora, é imprescindível que o Cade tenha cautela e evite posicionamentos diametralmente opostos em períodos tão exíguos de tempo (e.g., pouco mais de uma semana entre as decisões no caso CEFACE, em que ED opostos por terceiro interessado foram, por unanimidade, conhecidos, e o caso Montecitrus, em que não foram conhecidos, também por unanimidade) a bem do princípio da segurança jurídica que decorre sobretudo da coerência dos posicionamentos da autoridade julgadora.


(Gazeta Mercantil/Caderno A – Pág. 16)(José Inácio Gonzaga Franceschini – Advogado especializado em direito concorrencial, militante no Cade desde 1973. Sócio fundador do escritório Franceschini e Miranda Advogados.Próximo artigo do autor em 3 de julho. )
 

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