Mercado já projeta dólar a R$ 3 com racionamento

28 de fevereiro de 2015 | Sem comentários Análise de Mercado Mercado

Valor Econômico
18/02/15


A escalada do dólar em fevereiro, de 5,30% em relação ao real, reflete a piora da perspectiva para a economia doméstica diante do risco de racionamento de energia, dúvidas sobre a aprovação das medidas de ajuste fiscal e preocupação com o risco de rebaixamento da nota de crédito brasileira. Mas, apesar desses fatores já estarem no radar dos investidores, uma materialização do cenário mais adverso poderia levar a uma nova onda de depreciação do real, com o dólar ultrapassando o nível de R$ 3, avaliam analistas.


Para o economista Rafael Bistafa da Rosenberg & Associados, o atual patamar do câmbio, de R$ 2,83 por dólar, ainda não reflete plenamente a hipótese de racionamento de energia. E, se este for realmente decretado pelo governo, o economista acredita que a moeda poderia alcançar os R$ 3.


Para o BNP Paribas, o dólar pode bater em R$ 3,235 até outubro caso o Brasil tenha de racionar energia a partir de março, segundo estudo do banco assinado pelos estrategistas Gabriel Gersztein e Thiago Alday. Os cálculos tomam como base a dinâmica da taxa de câmbio percebida no racionamento energético de 2001.


A moeda brasileira sofreria mais pressão no segundo e terceiro trimestres, antes de se recuperar nos últimos três meses do ano. Com isso, o dólar romperia a barreira dos R$ 3 já em agosto e só voltaria a ser cotado abaixo desse patamar em dezembro. Em 22 de janeiro de 2016, a taxa de câmbio estaria em R$ 2,699, para os estrategistas.


O banco francês ressalva, contudo, que em 2001 a depreciação do real foi ditada por outros fatores como a eleição presidencial do ano seguinte, o ataque de 11 de setembro nos Estados Unidos e o calote da dívida soberana argentina. Numa tentativa de promover o isolamento do fator racionamento, o BNP descontou da depreciação cambial a queda de um índice global de moedas emergentes. O banco também assumiu que o tamanho e a duração de um eventual racionamento neste ano seriam similares aos de 2001, o que, o próprio banco reconhece, pode não se comprovar.


O Standard Chartered prevê que o dólar pode chegar a R$ 2,95 ao fim do primeiro trimestre, devido à combinação de fraca atividade econômica, inflação ainda elevada, risco de racionamento elétrico e um quadro mais desfavorável para moedas emergentes de forma geral. No entanto, caso o racionamento de energia elétrica se confirme, o dólar deve subir ainda mais contra o real, rompendo essa marca bem antes do esperado, para terminar o ano em R$ 2,80, aponta o estudo assinado pelos estrategistas do banco Italo Lombardi e Nick Verdi.


Os profissionais lembram que após o anúncio do racionamento de energia em 2001, o real acumulou até meados de setembro um tombo de 22% ante o dólar. No entanto, o Federal Reserve (Fed, banco central americano) promoveu naquele ano um agressivo afrouxamento monetário, o que, de alguma forma, ajudou a suavizar a depreciação da moeda brasileira até o fim de 2001. O cenário agora, contudo, é exatamente o contrário, com o Fed devendo subir a taxa de juros neste ano.


Além do risco de falta de energia, há muita incerteza no cenário, principalmente em relação à aprovação das medidas de ajuste fiscal. “Se houver muitas modificações nas medidas, o mercado vai ficar mais pessimista”, afirma Bistafa, da Rosenberg.


Segundo o economista-chefe do ING, Gustavo Rangel, o ajuste verificado recentemente na taxa de câmbio reflete uma correção das expectativas dos investidores diante da piora do quadro para a economia brasileira. “O mercado tinha se animado com a nomeação do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e com o anúncio de medidas de ajuste e agora entendeu que, com a economia brasileira entrando em recessão, esse ajuste será mais difícil.”


Por outro lado, a aprovação das medidas fiscais e de mudanças no seguro-desemprego, que serão votadas no Congresso até 2 de abril, pode trazer um alívio para o câmbio, afirma Alessandra Ribeiro, economista e sócia da Tendências Consultoria. A Tendências mantém a projeção para o câmbio de R$ 2,79 para o fim do ano.


A economista destaca que são esperados novos anúncios de medidas de contenção de gastos pela equipe econômica, na tentativa de compensar uma queda de receita, uma vez que a previsão é de um crescimento menor da economia.


A aprovação das medidas é um sinal importante para reduzir a preocupação com a possibilidade de rebaixamento do rating do Brasil, o que levaria o país a perder o grau de investimento. Esse risco passou a ser considerado pelo mercado após a divulgação do resultado fiscal do ano passado, que apresentou déficit de 0,6% do PIB. “O mercado ainda vai esperar os primeiros resultados fiscais para começar a incorporar esse risco no preço”, diz Bistafa, da Rosenberg.


Há uma grande preocupação com o cenário político, especialmente com o enfraquecimento do apoio da base aliada à presidente Dilma Rousseff e a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que tem mostrado uma posição contra o governo, para a presidência da Câmara, o que poderia dificultar a aprovação das medidas fiscais.


Apesar disso, os economistas não veem um risco de impeachment da presidente Dilma nesse momento e esse fator ainda não está refletido no preço do câmbio. “Embora as chances tenham aumentado, elas não estão nem perto de serem altas. No entanto, o mero fantasma do impeachment é suficiente para mudar o debate político e engordar os riscos de cauda no Brasil”, afirma o banco Brown Brothers Harriman em relatório.

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