Só até junho, montante emitido atinge R$ 92,2 bilhões; em todo o ano passado foram R$ 65 bilhões.
A emissão de títulos do agronegócio por bancos, agroindústrias, cooperativas e produtores rurais somou R$ 92,2 bilhões no primeiro semestre de 2010. Estimulados por boas margens e benefícios fiscais, mas ainda dependentes de ajustes regulatórios do governo, os novos papéis registraram 15,3 mil operações em seis meses.
Em 2009, as emissões desses títulos somaram R$ 65 bilhões em 18,2 mil operações. O volume negociado em 2010 equivale a todos os recursos aplicados em crédito rural na agricultura empresarial e familiar durante a safra 2009/10, encerrada em junho. No acumulado desde 2005, já foram emitidos R$ 201,4 milhões em quase 50 mil operações com papéis do agronegócio.
Os bancos são os principais responsáveis pela explosão nos negócios. As letras de crédito do agronegócio (LCAs), emitidas pelos bancos com lastro em recebíveis do agronegócio, respondem por quase 97% dos registros feitos na BM&FBovespa e Cetip.
Nesse ritmo, as emissões acumuladas devem superar R$ 300 bilhões até o fim deste ano. Os bancos estimavam chegar a R$ 400 bilhões apenas em 2014. Mesmo assim, já apontam a falta de recebíveis para atender à forte demanda pelos papéis. \”Há um apetite muito grande por LCAs. Hoje, o problema é a falta de papéis porque já virou operação de prateleira\”, afirma o diretor da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Ademiro Vian.
O sistema de registro apontava um estoque de R$ 12,4 bilhões de operações \”em aberto\” até 30 de junho. \”Esse negócio cresce porque é mais rentável para todas as pontas. E o cenário macroeconômico de aumento de juros não deve afetar a rentabilidade\”.
Os títulos foram criados há cinco anos para captar recursos privados ao financiamento do agronegócio, mas ganharam peso no mercado como fontes alternativas de crédito e opção de alta rentabilidade a bancos e seus clientes \”private\”, de alta renda.
Os títulos atraem cada vez mais investidores por seu baixo risco, alta liquidez e da garantia lastreada na produção. O custo de operação é taxa Selic mais 2% ou 3% ao ano. Além disso, há os benefícios fiscais dos papéis. As agroindústrias, por exemplo, não pagam Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A cada R$ 1 milhão emprestado, calcula Ademiro Vian, a empresa deixa de pagar R$ 18,8 mil, além de melhorar os índices de liquidez em seu balanço.
Os bancos são isentos do depósito compulsório de 25% sobre essas emissões, não precisam cobrir 100% do risco das operações e driblam os 0,2% obrigatório ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que afiança até R$ 60 mil por pessoa. Os investidores têm isenção de Imposto de Renda (IR). A cada R$ 1 milhão investido, a \”economia\” chega a R$ 19 mil com IR. As tradings também usam os papéis para captar recursos mais baratos e reduzir custos financeiros de \”carregar\” dívidas de produtores.
De 2005 para cá, houve reforço legal para a blindagem jurídica dos papéis, como a garantia de alienação fiduciária. Mas ainda persistem dúvidas de fundo. A Febraban pede mais regulação pelo Banco Central, como a obrigação de segregação da contabilidade e a garantia de exclusividade das emissões às empresas do agronegócio. \”Deveria haver uma obrigação de aplicação de parte desses recursos em crédito rural\”, afirma Ademiro Vian, também professor da FGV.
Os operadores dos títulos também apontam a necessidade de revisão da \”Lei da CPR\”, um dos principais recebíveis usados como lastro nas emissões. \”O governo precisa acabar com a \’CPR de gaveta\’, obrigar o registro em uma central e restringir a emissão somente a quem tem lastro na produção\”, recomenda o diretor da Febraban. Vian alerta para a criação de um \”subprime\” desses títulos, já que os controles sobre as CPRs são falhos. \”Tem caso de quatro CPRs para o mesmo produto, CPR prorrogada. Podemos, sim, ter um \’subprime\’ da CPR\”, avalia ele.
O BC informa que avalia formas de regular os títulos no sistema financeiro, como medidas para incentivar o registro de CPRs em um sistema único (Valor, 27/7/10)