Na primeira reunião plenária da 103ª sessão do Conselho Internacional do Café, realizada nesta quarta-feira (23), na sede da Organização, em Londres, o presidente da Frente Parlamentar do Café, deputado federal Carlos Melles, fez um discurso objetivo na abertura dos trabalhos, que surpreendeu a todos. (Confira a íntegra do discurso abaixo).
Em estreita articulação com o Itamaraty e com o Ministério da Agricultura, representado nas reuniões da OIC pelo seu Secretário Geral, Gerardo Fontelles, Carlos Melles surpreendeu os países produtores e consumidores da organização ao apresentar um discurso claro quanto a nova prioridade do Brasil: introduzir na agenda da OIC ações de sustentabilidade econômica.
Ao esclarecer o tema em reunião com os países produtores o parlamentar pontuou que a única forma dos produtores de café poderem sair da situação que se encontram é mediante preços remuneradores e que cabe a OIC um papel efetivo nesta direção.
A declaração do presidente da Frente Parlamentar foi seguida de reações positivas de várias delegações de países produtores, pedindo que o Brasil assuma efetivamente o seu papel de líder e empreenda negociações econômicas efetivas na OIC nesta direção.
Na parte da tarde, o deputado Federal discursou ao Conselho da OIC, repetindo as posições que já tinha externado aos países produtores.
A reação dos países membros do Conselho não poderia ter sido melhor. No curso da evolução dos trabalhos do Conselho as delegações dos Estados Unidos, Suíça, africanas e outras, foram incorporando nas estruturas das ações da organização a questão da sustentabilidade econômica.
Na avaliação do deputado, como se trata de uma organização multilateral, muito trabalho e negociação terá que ocorrer nos próximos meses para que o espírito instalado na reunião se transforme em ações concretas no âmbito da OIC.
DISCURSO DO DEPUTADO FEDERAL CARLOS MELLES
NA OIC, EM LONDRES, EM 23 DE SETEMBRO DE 2009.
Senhor Presidente,
Senhores Embaixadores e Altos-Comissários,
Distintos delegados dos países importadores, produtores e exportadores, e especialmente o Vice-Ministro da Agricultura do Brasil,
Senhoras e Senhores,
Recebam os cumprimentos do Congresso Brasileiro e dos milhares de cafeicultores do Brasil.
O processo de ratificação do novo Acordo Internacional do Café, assinado em 2007, levou o Congresso Nacional e a sociedade brasileira a empreenderem amplo processo de avaliação desta Organização e de sua contribuição para a cafeicultura mundial.
A análise em curso pelo Congresso Brasileiro, tem levado em conta os resultados alcançados no âmbito da OIC ao longo das duas últimas décadas, bem como a capacidade do novo Acordo de atender os anseios da cafeicultura nacional.
O fim das cláusulas econômicas da OIC e do sistema de cotas resultou na liberalização do mercado internacional, aumentando a competição entre exportadores. No caso do Brasil, todos devem se recordar, implementou-se política liberal quanto à comercialização externa.
Entretanto, a suposta liberdade de mercado não gerou os resultados esperados. Se, por um lado, foram liquidados os estoques reguladores nos países produtores, criaram-se novos estoques nos países importadores, transferindo a eles o poder de formação de preços, e acentuando o desequilíbrio entre a oferta pulverizada e uma demanda oligopolizada.
Assim, enquanto nos anos 1980, a participação da matéria prima no valor do produto final representava cerca de 30%, hoje, esta relação é inferior a 15%, chegando a anos anteriores a 7%. Longe de resultar na formação de mercado equilibrado, a liberalização acarretou maior concentração de poder econômico e empobrecimento dos produtores.
A comercialização do café a preços abaixo do custo de produção não tem permitido a remuneração da atividade produtiva e a reposição das lavouras, elementos essenciais para a sobrevivência do setor. O descasamento entre os custos de produção e os preços praticados pelo mercado mundial geraram expressivo endividamento de substancial parcela dos cafeicultores, em especial os pequenos produtores.
O surgimento de mercados de futuros e derivativos do café, apesar de oferecer instrumentos para a proteção cambial, produziu especulação, deprimiu preços e acentuou a volatilidade. Verificou-se, paralelamente, elevação dos custos dos insumos, como o preço da terra, mão-de-obra e fertilizantes.
A desvalorização da moeda norte-americana, na qual são cotados os preços dos produto, contribuiu para o agravamento da crise do café nos países produtores, gerando deteriorização do poder de compra.
Face à crise da cafeicultura mundial, a colaboração multilateral no âmbito da OIC, não tem sido capaz de produzir resultados consistentes, quanto à sustentabilidade econômica da produção mundial de café. Observa-se crescente frustração por parte dos países exportadores, no que diz respeito aos benefícios concretos gerados pela Organização.
A OIC, com sua longa experiência tende avaliar a presente conjuntura do setor cafeeiro e compreender as mudanças que se fazem necessárias, a de servir, de fato, os cafeicultores dos países produtores. A Organização deve ter a determinação e a coragem política de enfrentar os reais desafios da economia cafeeira mundial, o que significa não se furtar a discutir o principal tema dos produtores, ou seja, preços remuneradores.
Senhoras e Senhores,
Por meio do AIC 2007, a OIC deve sinalizar uma mudança de rumos quanto à defesa dos reais interesses da cafeicultura mundial e um novo paradigma na colaboração entre países produtores e consumidores.
Existe margem, no âmbito do marco jurídico do novo Acordo, para o fortalecimento das atividades da Organização, no que diz respeito à sustentabilidade econômica.
A discussão da Estratégia de Desenvolvimento para o Café, do Plano de Ação Estratégico para o Período 2009 a 2014, e do Programa de Trabalho da Organização para o ano cafeeiro 2009-2010, à qual vamos dar início nesta Sessão do Conselho, constitui a conjuntura ideal para a redefinição das prioridades da Organização, com maior enfoque em temas econômicos.
Devem ser privilegiados, entre outros, o aumento da participação dos países produtores na cadeia de valor agregado do café, a identificação e eliminação de barreiras tarifárias e não tarifárias, e de práticas que prejudicam a agregação de valor como escalada tarifária, bem como a criação de mecanismos de financiamento que permitam os produtores retomarem o controle do processo de formação de preços.
Conclamo os Governos aqui representados a empreender uma revisão de suas posições quanto ao efetivo apoio à sustentabilidade econômica da cafeicultura mundial, uma vez que a colaboração entre países produtores e consumidores é de fundamental importância para que possamos criar uma agenda efetivamente construtiva, na busca de uma conjuntura favorável para todos que fazem do café sua principal atividade.
O Governo brasileiro está pronto para cooperar com os demais Membros da OIC para esse fim. A prosperidade econômica do produtor é o melhor caminho para se chegar à sustentabilidade da cafeicultura mundial, incluindo seus pilares social e ambiental.
Muito obrigado.
Deputado Federal Carlos Melles
Presidente da Frente Parlamentar do Café
Delegação oficial do Brasil na 103ª Reunião da Organização Internacional do Café – OIC. Londres, 21 a 25 de setembro de 2009.