Desafio é agregar valor à produção

ECONOMIA & NEGÓCIOS
27/05/2010 
  

Para especialistas, região deve investir em tecnologia na produção de commodities
 
Ana Conceição, AGÊNCIA ESTADO – O Estado de S.Paulo

Responsável por 40% da produção agropecuária e por parte importante da exportação agrícola do País, a Região Sul tem agora o desafio de passar ao próximo estágio: o de agregar valor à produção.


\”Manter a estrutura de uma grande economia baseada em commodities não deve ser meta para ninguém. Temos que almejar uma modificação fundamental no modelo econômico do Sul\”, afirmou Belmiro Valverde Jobim Castor, professor de administração da PUC-PR, durante o Fóruns Estadão – Região Sul.


Segundo Valverde, a pauta de exportações da região mostra uma produção fortemente dependente de commodities agrícolas, como soja e carne de frango, e, em consequência, uma economia muito afetada pelas oscilações do câmbio. Reivindicar controle do dólar, contudo, não seria a solução.


\”Não se pode imaginar uma alteração na política cambial, então a exportação tem que ser mais eficiente\”, defendeu. Ele cita a soja como exemplo. \”A oleaginosa tem 50 subprodutos, mas exportamos apenas dois, farelo e óleo, além do próprio grão. Isso se aplica a outros itens, como a carne. Somos exportadores de carcaças.\”


Mesmo países mais avançados na exportação de itens agropecuários de alto valor agregado, como Estados Unidos e alguns europeus, têm intensificado a produção de alimentos certificados, funcionais e processados, diante da saturação dos mercados de commodities, que veem margens de lucro menores por unidade de produto e, por vezes, com grandes oscilações de preços. Com forte tradição agropecuária, a região tem condições para dar este salto de qualidade, mas para isso tem de resolver alguns problemas.


Para Valverde, a chave está na geração de tecnologia aplicada, além da capacitação empresarial e de mão de obra. Embora reconhecido por seu desenvolvimento, o Sul, como o resto do País, ainda não conseguiu traduzir ciência em tecnologia, diz. \”O Brasil é o 17.º maior gerador de ciência do mundo, mas está em 80.º lugar na geração de tecnologia. Não temos a tradição de passar de uma coisa à outra, mas temos de resolver isso, porque o mundo está indo nessa direção.\”


Nas palavras do diretor da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), José Roberto Ricken, \”tem de investir acima do pescoço\”. \”Cerca de 80% da população do campo tem baixa instrução.\”


Valverde cita dados da Fundação Anísio Teixeira, que mostram que no Sul a média de proficiência em Português e Matemática mal chega a cinco, numa escala de zero a dez. \”Educação é a chave da produtividade e é um dos fatores que fazem o Sul derrapar.\”


Enquanto a educação não melhora, Valverde identifica nos chamados arranjos produtivos locais, ou clusters, uma opção para ajudar especialmente pequenos e médios produtores, que são maioria no Sul, a agregar valor via apoio tecnológico e mercadológico. \”No Paraná há cerca de 20 arranjos produtivos locais de sucesso.\”


Ele cita o caso da cidade de Cianorte, no Paraná, que depois de quase quebrar com o declínio do café, encontrou na indústria têxtil o caminho para uma economia sustentável. Há também o exemplo dos sofisticados polos moveleiros no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, que exportam parte do que produzem. Mas, fora deles, de 70% a 80% da produção não tem design nem acabamento de qualidade, segundo o professor da PUC. O desafio é tornar os poucos e localizados avanços em uma política de produção generalizada.


Entre as iniciativas, Valverde lembra a da família do empresário catarinense Raul Anselmo Randon, a mesma da marca de autopeças e carrocerias, que desde 1997 fabrica um queijo do tipo grana, típico da região da Padânia, na Itália. \”Eles estimularam os laticínios a produzir um leite com determinado teor de gordura, trouxeram mestres italianos para aprimorar a técnica de produção e criaram uma linha de queijos que não existia no País.\”


Ricken, da Ocepar, também defende ganho de eficiência em outras áreas, como a redução do chamado \”custo Brasil\”, que no Sul corrói 36% do valor dos produtos, com destaque para os problemas logísticos. \”No Paraná, gastamos 37% do valor do calcário só em pedágios entre Rio Grande e Cascavel.\”


Agregar valor também reduziria disparidades regionais, fortes nos Estados, apesar da boa qualidade de vida e economia forte. O crescimento médio do Sul (3,2% ao ano) nos últimos 12 anos mascara uma realidade menos agradável em algumas áreas.


O professor da PUC lista mais de 200 municípios do Paraná, dos cerca de 400 do Estado, com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) abaixo da média do País. \”Hoje o interior do Paraná concorre com 30% do PIB do Estado, ante 65% da região metropolitana de Curitiba. Há 30 anos era o contrário. No Rio Grande do Sul ocorre algo parecido.\” 

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