O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu ontem que o setor exportador terá uma retração do crédito e que os produtores agrícolas também poderão, no futuro, enfrentar problemas de acesso a financiamentos. Ele reconheceu que essas serão duas conseqüências da deterioração financeira internacional, mas garantiu que o país tem solidez fiscal e o governo está atento para responder aos problemas. “Teremos uma recomposição do crédito em bases inferiores, porém não vai haver o estresse que estamos vivendo atualmente. Até lá, temos de estar preparados e atentos para responder às questões que se colocam para a economia brasileira”, comentou.
Mantega afirmou que ainda acredita que o Congresso americano vai aprovar o pacote de socorro aos bancos mais necessitados e, tão logo isso ocorra, vai haver uma distensão da situação internacional. O ministro também criticou a “irresponsabilidade” das instituições financeiras dos países desenvolvidos que estão no centro da crise. Ele defendeu uma diferenciação que reconheça a melhor situação dos países emergentes, porque suas economias são mais sólidas, têm mercado interno mais robusto, contas mais equilibradas e estão crescendo mais.
Ontem, foi feita uma avaliação da crise no Palácio do Planalto. O presidente Luiz Inácio Lula reuniu Mantega, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, e os ministros do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, e da Agricultura, Reinhold Stephanes. Participaram também o secretário de Comércio Exterior do MDIC, Weber Barral, a secretária-executiva da Camex, Lita Spínola, e o secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Edison Guimarães.
A discussão se deu em torno de duas questões: o impacto da crise sobre o volume de crédito nacional e internacional e as implicações no comércio exterior brasileiro. Essa foi a primeira reunião formal do grupo desde que a coordenação política de governo definiu, após a decretação de falência do Lehmann Brothers, a necessidade de um acompanhamento mais próximo da crise americana.
Segundo Mantega, o setor exportador está operando “normalmente” com alguma falta de crédito em dólares, o que “não o está impedindo de funcionar”. Disse ainda que o BC está fazendo leilões para dar um pouco de crédito em dólar às vendas externas.
No caso da agricultura, o ministro da Fazenda afirmou que não faltam recursos, mas “poderá haver algum problema mais adiante”, o que será resolvido pelo governo. Na avaliação feita, os ministros informaram ao presidente que há diminuição do crédito por parte dos bancos privados, mas, na semana passada, já foram tomadas medidas para aumentar a liquidez. “A situação é bastante normal no Brasil, embora haja esses problemas. A economia está funcionando normalmente, o mercado doméstico está bem, as empresas e os bancos brasileiros estão sólidos e o governo estará à postos para responder aos problemas a medida em que eles se colocarem”, afirmou Mantega.
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que se a crise financeira americana provocar de fato uma recessão nos Estados Unidos, a situação econômica mundial se tornará mais grave e os efeitos negativos poderão ser sentidos no Brasil. “Já faz um ano e três meses que essa crise se arrasta e ainda não houve nenhum trimestre de crescimento negativo nos Estados Unidos. Certamente, se houver uma recessão forte nos EUA, todo o mundo será afetado, inclusive o Brasil”, disse Bernardo.
Como a crise ainda está “circunscrita às instituições financeiras”, nas palavras de Bernardo, o Brasil ainda não sofreu abalos econômicos consideráveis. Mesmo assim, o país pode enfrentar dificuldades como restrição à oferta de recursos e redução da demanda externa por matérias-primas.
Bernardo assegurou que as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) não serão afetadas pela diminuição no volume de crédito internacional disponível porque a maior parte dos seus recursos estão previstos no orçamento ou são provenientes do BNDES.