São Paulo, 29 – A instabilidade registrada no mercado financeiro nas últimas semanas e reforçada hoje nas bolsas de todo o mundo está enxugando o crédito aos exportadores de commodities agrícolas do Brasil. Além de a disponibilidade de recursos ter recuado para níveis muito baixos, os poucos recursos que sobraram estão disponíveis a taxas muito elevadas e com prazo muito reduzidos em comparação ao período anterior ao início da crise financeira.
De acordo com o executivo de uma das principais empresas exportadoras de soja do Brasil, que preferiu não ser identificado, os bancos os bancos não oferecem mais crédito com tanta facilidade e têm cobrado taxas muito acima das habitualmente negociadas pelo setor. Segundo ele, o preço do dinheiro para financiar a exportação pode chegar a 15% ao ano. “Quem falar que tem acesso a crédito não está falando a verdade”, resume.
Além do juro mais elevado, o prazo de pagamento sofre um corte ao redor de 75%. Enquanto os prazos tinham em média 360 dias para pagamento, podendo superar esse período em alguns casos, com o agravamento da crise financeira o pagamento dos empréstimos não ultrapassa os 90 dias. “Nós só financiamos o produtor porque somos financiados na outra ponta. Se não temos acesso a crédito temos que represar todo o processo”, afirma o executivo.
Para o representante da indústria, o produtor terá que pagar mais para plantar a safra desse ano e provavelmente usará menos tecnologia. “Onde o agricultor usava 10, vai usar 5. Os juros estão mais altos e a tecnologia será menor”, afirma. Diante desse cenário, os preços da soja em Chicago fecharam hoje no limite de baixa. Os contratos para novembro encerraram o dia a US$ 10,94 por bushel, queda de 6% em comparação ao fechamento da última sexta-feira. Com o resultado de hoje, o preço do contrato novembro atingiu o nível mais baixo desde março deste ano.
Menos ACC – O vice-presidente, Jorge Esteve Jorge, do Conselho Deliberativo do Cecafé, entidade que reúne os exportadores do setor, avalia que o crédito para exportação está apertado e “deve piorar ainda mais”, com o agravamento da crise financeira nos Estados Unidos, cujos deputados rejeitaram hoje pacote de socorro aos bancos. Segundo ele, a contratação de Adiantamentos sobre Contratos de Câmbio (ACC) junto aos bancos “está mais difícil do que há um mês e com juros mais altos”.
O exportador ponderou, no entanto, que o embarque de café para este ano já está “praticamente todo contratado”. “Se a situação internacional continuar grave, haverá mais limite de crédito ao exportador, que se refletirá em redução do embarque no futuro”, explica. “O exportador tenta fazer o melhor possível, dentro de sua capacidade financeira”, acrescenta. Esteve Jorge considera, no entanto, que a crise global tende a provocar recessão nos países ricos, com diminuição do consumo de alimentos. Ele observa que o embarque de café em setembro deve ficar em cerca de 2,5 milhões de sacas de 60 kg. Em agosto, a exportação total foi de cerca de 2,2 milhões de sacas.
Do lado do setor produtivo, o clima hoje era de preocupação e expectativa em relação ao impacto da crise financeira nas cotações das commodities agrícolas. Alguns profissionais que atuam nas cooperativas de produtores rurais preferiram não se pronunciar e aguardar uma definição dos rumos do mercado.
(Alexandre Inacio e Tomas Okuda)