Franccino contra frappuccino
12.07.2007
Com a chegada da todo-poderosa Starbucks, a rede Fran’s Café teve de se reinventar. Mas uma pequena empresa pode sobreviver ao avanço de uma corporação?
Germano Lüders
EXAME A 97a loja da rede Fran’s Café, inaugurada no fim do ano passado em São Paulo, é completamente diferente das outras unidades do grupo. Instalada numa área anexa à rede francesa de livrarias e eletrônicos Fnac, no MorumbiShopping, na zona sul da cidade, a loja tem cadeiras de acrílico vermelho e branco, sofás redondos e mesas com tampo de vidro — um cenário concebido com a providencial ajuda de designers da Fnac. A razão para o capricho extra na decoração fica apenas alguns metros adiante, no mesmíssimo shopping. Foi ali que a americana Starbucks — cafeteria que virou marca e marca que virou estilo de consumo — abriu suas primeiras lojas no Brasil. E elas são um sucesso. Basta conferir as filas que se formam em frente aos caixas da Starbucks em comparação ao público rarefeito da loja do Fran’s. “Isso não nos preocupa. Acreditamos que há espaço para todos e que a Starbucks será positiva para o mercado de cafés brasileiro”, diz Francisco Conte, fundador do Fran’s Café. Por enquanto, os americanos ainda são pequenos no Brasil — além das duas lojas no MorumbiShopping, a Starbucks tem apenas mais três unidades, ante 100 do Fran’s. Mas a perspectiva de ter um gigante na vizinhança não é nada agradável, especialmente se você fatura 30 milhões de reais e seu oponente é uma empresa com 13 000 lojas, espalhadas por 40 países, e faturamento de quase 8 bilhões de dólares por ano.
Há cerca de cinco anos, os executivos do Fran’s Café perceberam que a chegada da Starbucks ao país era apenas uma questão de tempo — e o confronto, inevitável. O primeiro sinal, em 2002, veio por meio de uma proposta feita por representantes da rede americana para que a empresa se associasse à marca no Brasil. “O custo para entrarmos na sociedade era muito alto, e não tínhamos como bancar a cota de 80% do capital que eles exigiam”, diz Henrique Ribeiro, diretor do Fran’s. A partir desse momento, foi estruturado um plano caso a Starbucks se instalasse aqui. O primeiro passo foi estabelecer um cronograma para ampliar a rede de lojas do Fran’s de 65 para 100 unidades — meta alcançada em janeiro deste ano. O segundo foi reforçar o marketing, uma vez que a rede era conhecida como um ponto-de-venda de café expresso, mas passava longe das chamadas “experiências” oferecidas pela Starbucks aos clientes — decoração bem cuidada, serviço personalizado, cafés de diversas procedências, seleções musicais especialmente feitas para as lojas e um cardápio escorado tanto em versões quentes como geladas da bebida. “Esse foi o ponto mais complicado, porque exige um investimento pesado, mas reconhecemos que ainda há muito por fazer”, diz Conte.
AS MUDANÇAS NO FRAN’S foram consideráveis. O café servido na loja passou a ser feito de uma mistura de grãos exclusiva que ganhou marca própria, a Fran’s. O cardápio foi ampliado com san duíches e novidades, como cafés especiais e o Franccino, espécie de milk-shake de café copiado do Frappuccino, carro-chefe da rede americana. As lojas ganharam nova identidade visual e foram equipadas com sistema de conexão Wi-Fi. Louças, talheres e copos foram trocados por outros de melhor qualidade. O Fran’s Café também investiu em um novo conceito de ponto-de-venda, o station, inspirado (adivinhe!) na Starbucks. Trata-se de um quiosque com 9 metros quadrados que precisa de apenas uma tomada comum para ser instalado. A miniloja tem cardápio reduzido, mas vende cafés, sanduíches e pães de queijo. Atualmente há 14 stations em São Paulo.
Briga desigual | ||
Comparação entre os tamanhos do Fran’s Café e da Starbucks | ||
Fran’s Café | Starbucks | |
Número de lojas | 100 | 13 000(1) |
Faturamento | R$ 30 milhões(2) | US$ 7,8 bilhões(2) (global) |
Preço do frappé de café | R$ 7,20 | R$ 7,50 |
(1) No Brasil são cinco unidades (2) Em 2006 Fonte: empresas |
Ainda é cedo para dizer se as mudanças realizadas pelo Fran’s Café serão suficientes para manter o crescimento da empresa frente à chegada de um concorrente tão poderoso. No entanto, não são raros os casos em que empresas locais enfrentam com galhardia concorrentes globais. Nas Filipinas, a rede de fast food Jollibee, que nasceu de um quiosque de sorvetes em Manila, reinventou-se quando soube que o McDonald’s chegaria ao país, no início dos anos 80. Incorporou hambúrgueres ao cardápio, mas também adaptou pratos típicos ao modelo fast food. Investiu maciçamente em marketing, e seu símbolo — uma abelha vestida de cozinheira — tornou-se um ícone nacional. Resultado: a rede conta com mais de 570 lojas nas Filipinas. O McDonald’s, por sua vez, não tem mais que 300. Na Índia, a Coca-Cola enfrentou a pesadíssima concorrência de um refrigerante local, o Thumbs Up Cola, e a disputa só acabou quando a multinacional comprou a marca indiana em 1993, por 60 milhões de dólares. “Se a companhia local souber aproveitar seu conhecimento de um mercado específico e concentrar esforços em aspectos pouco explorados pelo concorrente global, tem grande chance de manter-se atuante e crescer”, disse a EXAME Niraj Dawar, professor de negócios da Universidade de Western Ontario, no Canadá, e autor do estudo “Competindo com gigantes”, um clássico no assunto, publicado na Harvard Business Review. É seguindo à risca essa receita que o Fran’s Café planeja crescer 35% em faturamento em 2007 e chegar até o fim do ano com 120 lojas.