A chamada cadeia do café, que inclui a lavoura, o setor de moagem e torrefação e a indústria de solúvel, é o segmento da economia brasileira que mais emprega pessoas, demandando mão-de-obra direta e indireta de mais de 8 milhões de trabalhadores, mais do que a construção civil ou a indústria automobilística. A este importante segmento cabe um destacado desempenho no comércio exterior brasileiro, pois, dentro do agronegócio nacional, o café já é um dos setores que mais exportam, gerando importantes divisas para o País.
No que toca ao aspecto social, o café cumpre o importante papel de manter o agricultor no campo, posto que é uma cultura não mecanizada, para a qual o conhecimento, a atenção e o labor humano são imprescindíveis. Ao fixar o homem na terra, o setor cafeeiro ajuda a reduzir o êxodo rural, processo que tem se agravado nas últimas décadas, provocando o inchaço de nossas cidades, a desigualdade social e todas as mazelas que lhe são associadas, notadamente a violência urbana. Pode-se dizer que a economia do café é um importante fator de distribuição de riquezas e de equilíbrio social.
Pois bem, dentro desta cadeia, o ramo capaz de conquistar novos mercados e agregar valor às exportações, mantendo a mobilização de nossa competitiva lavoura e fixando o homem na terra, é a indústria de solúvel. Ressalte-se que o café industrializado vale cerca de 200 vezes mais do que a commodity (o café em grão).
Cabe lembrar que todos os mercados do café verde brasileiro já foram totalmente explorados e, por isso, permanecem os mesmos desde o fim do século 19. Assim, as novas fronteiras comerciais do setor estão sendo abertas, há duas décadas, pela indústria brasileira de solúvel, graças à tecnologia de ponta desenvolvida e adotada por seu moderno parque industrial, aos seus processos altamente produtivos, bem como ao volume e à qualidade do café produzido no Brasil, maior produtor mundial do grão. Porém, o crescimento da indústria brasileira de café solúvel tem esbarrado nas mais nefastas práticas protecionistas dos países desenvolvidos, em especial a União Européia (UE), que, ciente da alta competitividade brasileira, vem impondo uma injustificável barreira tarifária ao produto industrializado nacional. Desde janeiro de 2006, a UE sobretaxa o solúvel brasileiro em 9%, sob o argumento falacioso de que tal barreira tarifária tem o fito de beneficiar países da África e da Ásia que se encontrariam em grau de desenvolvimento inferior ao Brasil.
Fala-se, ainda, que o imposto é uma forma de ajudar países produtores de drogas, levando-os a substituí-las pelo cultivo de alimentos. Por isso, outros produtores de café, como a Colômbia, não são sobretaxados pela UE. Estabelecido dentro do Sistema Geral de Preços da União Européia, este imposto tem, com efeito, protegido as indústrias de países europeus – que não produzem o café verde – da alta competitividade brasileira. Na essência, a barreira tarifária constitui uma discriminação inadmissível, uma forma de manter em estado colonial, de fornecedora de matéria-prima e não de produtos manufaturados, uma nação que luta para alcançar o pleno desenvolvimento industrial. Basta dizer que, em 2006, a partir da sobretaxa, nossas vendas de solúvel para a Europa caíram 10%. A restrição de mercado tende a crescer na medida em que novos membros aderem à União Européia, ou seja, perdemos consumidores à medida que a comunidade européia se robustece.
Outro efeito deletério desta discriminação tarifária está representado pela fuga de investimentos, pois nenhum investidor vai querer implantar novas fábricas num país que é sobretaxado pela Europa, o maior bloco econômico do mundo. Por sinal, diversos projetos de novas fábricas de solúvel já foram transferidos para outros países. O governo federal, preocupado com o nosso desenvolvimento e a geração de empregos, não pode se omitir nesta questão. Por agregar valor ao café verde, beneficiando as exportações, e representar uma demanda certa para a produção de nossas lavouras, que empregam milhões de brasileiros, a indústria de solúvel merece o apoio decisivo de nossos dirigentes e de toda a sociedade na luta contra este infame imposto europeu.
Ruy Barreto Filho é diretor do café Solúvel Brasília e vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de café Solúvel (Abics)